A mortalidade nas crianças acometidas pela Síndrome Congênita do Zika (SCZ) em Pernambuco chega a 5,27% quando se considera todos os 2.353 bebês notificados com as possíveis malformações cerebrais. Até agora 124 óbitos foram reportados à Secretária Estadual de Saúde (SES), número bem superior ao de outras infeções congênitas, como sífilis e HIV. O percentual sobe para quase 30% quando se comparam as mortes com os 417 casos confirmados da infecção em recém-nascidos e pula para 50% quando a razão é feita diante dos 241 casos em investigação.
Diante deste cenário, a SES lançará nas próximas semanas as Diretrizes de Vigilância Epidemiológica das Síndromes Congênitas Relacionadas à Infecção pelo Vírus Zika e Outras Etiologias Infecciosas em Pernambuco.
O documento, inédito no País, vai estabelecer critérios para a padronização da doença, que até então nem tem um Código Internacional da Doença (CID) próprio, e classificação de morte. Com a normatização será possível definir melhor a investigação sobre as mortes suspeitas pela SCZ, que hoje somam 102 óbitos na fila por respostas. “Tivemos que padronizar algumas questões para facilitar esse processo de óbitos que ainda estão em investigação. Dessa seara enorme que está em investigação teremos os que são prováveis, inconclusivos, confirmados e os descartados”, disse a diretora de Informações e Ações Estratégicas em Vigilância Epidemiológica da SES, Patrícia Ismael. Até agora, só 22 bebês que faleceram tiveram a investigação completa depois da confirmação laboratorial do vírus. Desses, 15 positivaram para microcefalia por zika e sete foram descartados.
Parte dessa lacuna está na condição de alguns natimortos, que inviabilizam a necropsia, e também na existência de apenas duas unidades do Serviço de Verificação de Óbito (SVO) no Estado para realizar exames e coletar amostras para detecção do vírus no Instituto Evandro Chagas (IEC), no Pará. Para se ter uma ideia, menos da metade dos casos, 53, foram necropsiados e enviados para o IEC. Apenas 18 resultados foram devolvidos pelo instituto e, desses, cinco apresentaram-se inconclusivos. “A velocidade, infelizmente, não é a que desejávamos, pela complexidade que se tem e a responsabilidade que precisamos ter enquanto órgão público”, afirmou o coordenador das síndromes congênitas e neurológicas relacionadas às arboviroses, Jadson Galindo.
Outro recorte que chama a atenção na análise da mortalidade de bebês com suspeita do zika é a disparidade com relação a outras doenças de transmissão vertical (da mãe para o feto). Enquanto em 2,5 anos (2015-2017) 124 crianças entraram nas estatísticas de morte por SCZ, a sífilis provocou 42 falecimentos de bebês entre 2012 e 2014 e o HIV foi responsável por oito casos no mesmo período.
Patrícia Ismael comentou que essas duas doenças, diferentemente do zika, já têm rotinas de prevenção e tratamento estabelecidas, que podem evitar mortes e sequelas. No zika a situação é outra, e mais grave. “Neste caso, só temos como reduzir o dano para aquela criança sobreviver, mas não evitar que ela tenha a síndrome”, lamentou. Foi provavelmente esse temor de uma doença sem prevenção ou trato que fez cair em quase 10% a natalidade no Estado entre 2015 e 2016. A redução no número de nascidos vivos foi de 14.336 entre esses anos.
Além de se destacar entre as infecções congênitas, as anomalias decorrentes do zika também acenderam o alerta para os óbitos de bebês com malformações. “Muitas vezes essas malformações passavam desapercebidas e hoje a gente vê que elas têm proporção grande entre os óbitos de menores de um ano no Estado”, contou Ismael.
As mortes por malformações de causas diversas ocupam a 2ª colocação no ranking de falecimentos, com 1,3 mil ocorrências entre 2012 e 2014.
Maioria é natimorta e neomorta – No perfil traçado pela SES sobre a mortalidade, a grande maioria dos bebês não alcança o primeiro mês de vida. Os que já nasceram mortos são 50, os neomortos (até 28 dias de vida) são 51. Outros 19 ocorreram depois desse período. Já os óbitos fetais somam quatro.
O falecimento das crianças sempre gera comoção e questionamentos entre as mães, principalmente no caso de bebês maiores. “Minha filha nunca teve nenhum problema e na primeira internação morreu. Foi um caso de negligência”, reclamou a dona de casa Kely Romualdo, 36, mãe de Maria Vitória, 1 ano e 9 meses, vítima de uma infecção generalizada no final de junho.
A dona de casa Gilvânia Marques, 27, perdeu o filho Daniel, de 8 meses, no ano passado, para uma pneumonia depois de algumas intercorrências respiratórias. Para as mães, falta experiência no trato. Muitas dessas questões de saúde, estimulação e longevidade das crianças serão abordadas no 1º Congresso de Pais de Crianças com Microcefalia, na sexta-feira, organizado pelo núcleo de apoio da SES. Para o encontro são esperados cerca de 200 familiares de 20 cidades da 1ª Regional de Saúde, que compreende o Recife e Região Metropolitana.
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