Marina ficou 22 anos em silêncio absoluto por causa da depressão

Hebert Silva Santana aprendeu a ser pai da própria mãe quando tinha apenas 13 anos. No rearranjo familiar, necessário para cuidar da depressão severa de Marinalva Santana, então com 45 de idade, coube ao quarto – na escadinha de cinco filhos – cuidar da mulher que parou de falar, sorrir e ocupava os cantos da casa com um “silêncio perturbador”, lembra ele.
“Aprendi a tingir os cabelos da mamãe, pintar as unhas, dar banho, comida. Fazia tudo com carinho, mas sentia falta de um cafuné que só mãe sabe dar”, conta. Agora, após completar o 36º aniversário, Hebert reaprende a ocupar o papel de filho.
Um tratamento brasileiro, pioneiro e inédito no mundo, trouxe de volta a voz e a expressão à Marina – como gosta de ser chamada. Foram 22 anos calada pela sequela depressiva chamada catatonia (em que há paralisação de manifestação de sensações e até de movimentos simples, como a fala).
Há 60 dias, ela voltou a dizer em alto e bom som não gostar “nada nada” do “alva” que completa o nome. “Prefiro Mara ou Marina”, orienta.
O tratamento que devolveu a mãe a Herbert consiste em dois eletrodos, um vermelho e um azul, ligados ao cérebro por uma corrente elétrica mínima, inferior a 9 volts (não precisa nem conectar o aparelho à tomada). Cada sessão de eletroestimulação cerebral tem duração contínua de 30 minutos. O processo neuroquímico está em testes na Santa Casa de São Paulo e ainda não pode ser usado como padrão clínico. Marina foi a primeira catatônica a ser submetida e agora já são cinco pacientes participantes do projeto, contabiliza o autor do estudo, Pedro Shiozawa, coordenador do Laboratório de Neuroestimulação da unidade.
“Minha mãe estava em estado vegetativo e eu quase sem esperança. Meu pai, que trabalhava feito camelo para nos sustentar e não saiu do lado dela, dizia que para viver não se pode esmorecer”, recorda Hebert.
“Eu acreditava naquela frase. Já tínhamos tentado de tudo. Então surgiu a oportunidade de participar da pesquisa na Santa Casa”, conta o filho número quatro, gerado depois de Helen e mais velho do que a caçula Hevelyn.
Depois da segunda vez em que Marina passou pela técnica experimental, conta Hebert, a mãe voltou a se expressar com palavras. Ao final do ciclo completo de 12 sessões conseguiu justificar à reportagem a escolha dos nomes dos filhos.
“Todos com H, nossa marca registrada. Acho lindo e chique”, explica ela que nasceu em Salvador, Bahia, conheceu o primeiro namorado aos 13 anos, namorou Edivaldo Santana por carta durante dois anos e, aos 17 foi a São Paulo para casar com o pai dos “5 filhos com H”.
Eletrochoque não
Shiozawa explica que o nome correto do tratamento que mudou a história de Marinalva é chamado de eletroestimulação contínua. “O cérebro do depressivo funciona de maneira desequilibrada, uma parte produz neurotransmissores em excesso e a outra não”, diz.
“Com os eletrodos, buscamos o equilíbrio e nossos resultados são muito promissores, em especial para quem não reage aos medicamentos existentes”, acredita o especialista.
A eletroestimulação contínua começou a ser pesquisada em 2006, como alternativa para doenças que provocam desequilíbrios cerebrais, entre elas depressão, transtorno bipolar , esquizofrenia , nos Estados Unidos (EUA).
O médico esclarece que o tratamento é diferente do eletrochoque – técnica que acabou marcada pelo mau uso e pelos danos provocados – pois além de usar voltagem mínima, não causa convulsão e nem cicatrizes cerebrais, como os antigos mecanismos elétricos. - Fonte: Último Segundo

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